sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

A era dos aquários



"Mãe , não olhe agora mas tem uma menina pequenininha na outra mesa com um tablet do tamanho de uma televisão" 

"Onde?"

"Ali, atrás da mesa onde dois bebês estão brincando nos celulares dos pais"

Meu filho tem agora sete anos. Ele é uma criança de sua geração. Sim, isto significa que ele domina perfeitamente, gadgets os mais variados. Meu filho tem agora sete anos. Ele é uma criança. Sim, isto significa que ele corre, brinca e pula sem parar. 

Quando saímos para locais públicos não levamos eletrônicos. Não há proibição, apenas o consenso de que os aparelhos tem custo alto, podem ser perdidos ou quebrar com facilidade e simplesmente não vale a pena. Quando saímos a ideia é passar um tempo juntos vendo coisas diferentes. Deixamos os jogos para quando não há nada melhor a fazer. Em nossas saídas onde possa ter algum tempo de espera,  suas distrações são livros, gibis e conversas com as pessoas que o acompanham. Ele adora conversar e trocar ideias. Como dito no início do texto, ele adora a tecnologia atual. Acaba de ganhar um ipad da avó - o ipad é usado, a avó não se adaptou. A avó é uma criança de outra geração - e está muito satisfeito em poder jogar seus joguinhos. Meu ponto de argumentação aqui é que a criança de hoje gosta e compreende aparelhos eletrônicos ultramodernos tanto quanto eu fazia com minha pequena vitrola no passado. Eu gostava muito de ouvir meus disquinhos e ganhei minha vitrola para não acabar com a agulha da vitrolona do papai. Por outro lado, a vitrola era somente um meio quando o fim era ouvir as histórias em disco vinil compacto. 

No caso dos tablets e smartphones, eles também são apenas um meio.  Para os pequenos o fim é utilizar os jogos, brincar. Defensores ferrenhos dos eletrônicos dizem que são educativos e que até o presidente Barack Obama tem incentivado crianças a usá-los mais e mais, por meio do aprendizado da programação. Bem, uma coisa é uma coisa, outra coisa é diferente. Que de meros usuários caminhamos para um futuro onde todos precisarão conhecer alguma coisa de programação, isto parece bem claro. Existem coisas contudo, na educação de uma criança, que independem do uso de computadores, celulares e tablets. Filosofia é uma delas. Não é preciso mais que um cérebro humano para desenvolver e resolver um questionamento filosófico. Aliás todas as áreas da ciência e do pensamento foram desenvolvidas sem computadores até pouco mais de duas décadas. Quando o computador pessoal apple apareceu, em 1977, o mundo já existia e as pessoas já pensavam. A nova tecnologia é, pois, de meio. A maior máquina permanece dentro de nossas caixas cranianas. 


Por este motivo quando me dizem que se usar mais computadores meu filho será mais inteligente, criativo ou com capacidade de liderança, fico penso na criança que foram Leonardo Da Vinci, Santos Dumont, Albert Einstein. Imagino a Nona Sinfonia necessitando do Encore para ser composta, e Don Quixote saindo de um editor de texto. Imagino Alexandre, o grande, sendo educado por aplicativos desenvolvidos por Aristóteles. Não confunda meu pensamento com saudosismo. Estou aqui valorizando células cinzentas, a leitura, o pensamento filosófico e a compreensão da matemática como explicação de nosso mundo. Gadgets são apensas instrumentos, nossos filhos já nascem inteligentes, criativos e dotados de diversas capacidades. A paralisia causada pelos aparelhos eletrônicos nega às crianças outras experiências. A primeira delas é a experiência do olhar. Olhar, simplesmente olhar as coisas. Crianças hipnotizadas por telas numa saída com os pais não olham pela janela do carro, não olham o mundo ao redor e precisam passar no farmácia depois para comprar um colírio que lhes umidifique os olhos. São como pequenos e lindos peixes ornamentais em aquários, olhando a realidade de fora distorcida pela parede de vidro ao seu redor.  No restaurante, ficam quietinhas e todos em volta agradecem enquanto comem sossegados sem o som da infância. Sim eu sou uma criança de outra geração, eu sei o que é uma vitrola. 

Meu filho continuará usando aparelhos de seu tempo para o resto da vida. Do mesmo jeito que Cervantes usou a pena e não a parede de pedra de sua caverna. Mas sua massa encefálica, sua inspiração, seu eventual gosto para ciência e discussão sobre o mundo deverão ser os fatores a fazer a diferença entre ele e um robô. Assim espero. 

Um comentário:

  1. Concordo plenamente! Minha pequena tem apenas 2 anos e sei que logo será seduzida por todos estes aparatos eletrônicos (aliás, já é!) Mas desde já tento reduzir o tempo de uso destes meios, incluindo a TV. Até hoje, consegui convencer meu marido a não comprar um DVD para colocar no banco traseiro do carro. Não sei por quanto tempo mais ele acatará minha decisão... Também acredito que essa restrição é o que a tornará mais humana, mais crítica, mais criança e mais conectada com a realidade. Em excesso, estes aparatos tornam-se meros artefatos de fuga da vida real e embotam o sujeito.
    bebesemfirulas.blogspot.com.br

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